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Quando a máquina estatal perpetua o sofrimento: o caso Raquel Cantarelli e a urgência da dignidade humana no âmbito jurisdicional

Por Vinicius de Almeida Santana Melo

Quando a máquina estatal perpetua o sofrimento: o caso Raquel Cantarelli e a urgência da dignidade humana no âmbito jurisdicional
Foto: Divulgação

Há episódios no itinerário judicial brasileiro que transcendem o campo técnico e adentram o território sombrio das tragédias humanas patrocinadas — ou ao menos perpetuadas — por instituições que deveriam zelar pelos direitos fundamentais. A história de Raquel Cantarelli é, com pesar, uma dessas marcas infames no tecido do Estado de Direito.

 

Raquel, mulher brasileira e mãe de duas meninas, teve sua vida dilacerada em 2023, quando uma decisão teratológica — proferida por Desembargador Federal integrante do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) — a destituiu abruptamente do convívio com suas filhas menores, sem que sequer lhe fosse oportunizado o básico: o direito de ser intimada para apresentar manifestação. 

 

Trata-se, com o perdão do eufemismo, de uma aberração jurídica que ofende frontalmente o devido processo legal, a ampla defesa e os princípios mais basilares da dignidade da pessoa humana.

 

Mas não se trata apenas de um erro técnico. A decisão — que se ergueu como sentença de exílio materno — tangenciou, com acintosa ousadia, a intolerância cultural e o preconceito estrutural. 

 

Sua fundamentação, por vezes enviesada e insidiosa, flertou perigosamente com manifestações xenofóbicas dirigidas a mulheres brasileiras que residem no exterior, especialmente aquelas em condição de vulnerabilidade decorrente de episódios de violência doméstica. 

 

Em um Estado que se pretende Democrático de Direito, não há espaço legítimo para julgamentos que projetam estigmas sobre o gênero, a nacionalidade ou a dor alheia.

 

Posteriormente, foi o Superior Tribunal de Justiça (STJ) quem restabeleceu a ordem jurídica vilipendiada, reconhecendo o caráter arbitrário da decisão e assegurando a Raquel, com acerto técnico e sensibilidade institucional, o direito ao convívio com suas filhas. 

 

Contudo, tal reabilitação judicial permanece até hoje tolhida em sua concretude, diante da reprovável interposição de embargos de declaração por parte da Advocacia-Geral da União (AGU) — não com o intuito legítimo de aclarar obscuridades ou suprir omissões, mas com o deliberado propósito de procrastinar o cumprimento de um comando judicial já firme e embasado.

 

É preciso frisar um ponto muito importante. 

 

A Defensoria Pública da União (DPU), que atua como legítima representante de Raquel nesse procedimento — bem como na representação internacional que tramita perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) — manifestou-se de forma veemente contra tais embargos, asseverando que não há qualquer obscuridade ou dúvida a ser sanada. 

 

O Ministério Público Federal (MPF), por sua vez, órgão incumbido da defesa da ordem jurídica e do interesse público, corroborou integralmente essa posição, tanto na fase em que a decisão foi revertida no STJ quanto agora, diante da clara tentativa da AGU de paralisar os efeitos do julgado.

 

Na qualidade de advogado constituído de Raquel Cantarelli em outros procedimentos, inclusive nos que ainda virão, não posso silenciar diante do uso instrumentalizado da burocracia estatal para retardar a justiça e perpetuar o sofrimento de uma mulher que já ou mais do que o razoável. 

 

O processo judicial não pode se converter em novo mecanismo de opressão. O tempo, quando manipulado por expedientes protelatórios, transforma-se em verdugo silencioso.

 

A resistência da União, que atua não como defensora da legalidade, mas como obstáculo à efetividade do direito reconhecido, constitui afronta direta ao artigo 6º do Código de Processo Civil, que consagra o princípio da cooperação, e à cláusula pétrea da dignidade humana, prevista no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. 

 

É, enfim, expressão contemporânea da violência institucional, que não se dá pela força bruta, mas pelo adiamento calculado e pela indiferença.

 

Este artigo não é um apelo. É uma denúncia. Um chamado à razão. Um grito contra a letargia institucional. 

 

O STJ tem a chance histórica de demonstrar que suas decisões não podem ser reduzidas a meras declarações simbólicas, desprovidas de força transformadora. 

 

A Corte deve repelir os embargos da União com a contundência que o caso exige — não apenas por imperativo técnico, mas por fidelidade à Justiça enquanto valor ético e civilizatório.

 

Raquel Cantarelli não busca privilégios. Não mendiga deferências. Reivindica o que já lhe foi reconhecido: o sagrado direito de exercer sua maternidade. De viver o presente que lhe foi roubado. De ver crescerem as filhas a quem nunca deixou de amar.

 

Que o Judiciário não se curve ao silêncio das gavetas. Que não se permita que a verdade, uma vez proclamada, seja sepultada sob o peso da procrastinação.

 

Que se cumpra o Direito.

 

E que Raquel, enfim, possa viver a justiça não apenas como promessa, mas como realidade.

 

*Vinicius de Almeida Santana Melo é advogado

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias