Maria Marighella analisa década de retrocessos e destaca retomada da cultura com Lula: “Foram dez anos de interrupção, mas com resistência”
Primeira mulher nordestina a presidir a Funarte, Maria Marighella fez um balanço sobre o que representou o hiato entre sua saída do governo federal, em 2015, e o retorno ao Ministério da Cultura, em 2023. Em entrevista ao Bahia Notícias, ela destacou que o período foi marcado por retrocessos, desmonte institucional e perseguição à classe artística. Apesar disso, Marighella ressalta que o setor resistiu e acumulou vitórias mesmo durante o ciclo de adversidade.
“Avaliar esse tempo é lembrar que o Ministério da Cultura é símbolo da redemocratização do Brasil. Criado em 1985, ele nasce com essa força, com essa insígnia”, afirmou.
Para ela, não é coincidência que momentos de instabilidade democrática tenham como reflexo o enfraquecimento ou a extinção da pasta. “Quando há governos autoritários ou antidemocráticos, o Ministério sofre interdições. A democracia é da natureza da cultura.”
A gestora destacou que a volta do governo Lula marcou um novo ciclo para a cultura no país, com um compromisso claro de reconstrução do setor. “Foi um gesto potente. O governo retorna com a cultura como prioridade, reafirmando a institucionalidade não como mera burocracia, mas como ferramenta de produção de direitos, garantias e liberdade.”
Para Marighella, os dois primeiros anos da nova gestão foram marcados pela recomposição de políticas públicas, fortalecimento orçamentário e descentralização dos recursos. “Há um esforço radical para romper com a concentração dos investimentos no eixo econômico do país. A nacionalização da política cultural é um compromisso.”
Apesar de apontar uma década de descontinuidade, a presidente da Funarte enxerga resistência ativa da classe artística. “Mesmo sem investimento público, a arte brasileira não parou. Tivemos grandes obras, como o filme Marighella, de Wagner Moura, que surgiu em meio à censura. O setor seguiu sendo voz e força, mesmo diante da perseguição.”
Entre as conquistas recentes, Marighella destacou a Política Nacional Aldir Blanc, que iguala o investimento direto em cultura ao modelo tradicional de fomento por renúncia fiscal, como a Lei Rouanet. “É a maior política de fomento federal da história e representa uma virada ao permitir a transferência de recursos para estados e municípios.”
Ela também celebrou a criação do Sistema Nacional de Cultura, comparando-o ao SUS em termos de estrutura federativa. “É a primeira vez que temos um marco institucional que permite à cultura ter um sistema com divisão de responsabilidades.”
Ao lembrar de seu trabalho em 2015, quando atuou na formulação da Política Nacional das Artes na gestão de Juca Ferreira, Marighella reforçou que a retomada atual atualiza aquele esforço interrompido. “Volto à Funarte com a missão de finalmente consolidar uma política nacional das artes, algo que nunca foi devidamente estruturado no país. É a principal entrega que queremos fazer neste ano em que a Funarte completa 50 anos.”