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Entrevista

“Ficou mais visível”, avalia especialista sobre presença de facções em eleição na Bahia

Por Francis Juliano

“Ficou mais visível”, avalia especialista sobre presença de facções em eleição na Bahia
Dudu Ribeiro, da Iniciativa Negra

A presença das organizações criminosas na Bahia reverbera também na política. Nas eleições deste ano, políticos de vários espectros ideológicos se queixaram e relataram casos de intimidação. Para o especialista em segurança e cofundador da Iniciativa Negra, Dudu Ribeiro, a relação do crime com a política só ficou mais visível neste ano, mas já ocorre há um tempo. Em entrevista ao Bahia Notícias, Ribeiro criticou o modelo de polícia dominante, que funciona na “lógica da guerra”; avaliou a situação do governador Jerônimo Rodrigues diante do problema e declarou que os municípios baianos de pequeno porte podem interferir, mesmo diante das limitações, em colaborar na diminuição dos índices de violência. Leia a entrevista completa abaixo:

 

Você acredita que neste ano a interferência dos grupos criminosos nas eleições foi mais visível?
Nós avaliamos que ficou mais nítido, por isso teve um interesse maior da imprensa. Como a gente está vivendo na Bahia inteira um acirramento dos conflitos ligados ao tráfico de drogas. De fato pode ter havido mais episódios.

 

Fala-se cada vez mais na presença de políticos financiados pelo crime organizado. Também isso aconteceu nessa eleição?
Na verdade, sempre teve isso. Na existência dessas organizações criminosas, a relação política sempre esteve presente. Não apenas como o Executivo e o Legislativo, mas também bastante com o Poder Judiciário. 

 

Um levantamento da Secretaria Nacional de Políticas Penais aponta que há 21 facções criminosas na Bahia, das 88 do país. O maior número por estado. Como minimizar esse drama?
Primeiro, fazer mudanças profundas, inclusive na forma como o estado brasileiro lida com a questão das drogas. Foi o estado brasileiro que optou por fazer uma guerra para lidar com um problema complexo, que é o uso de substâncias. Isso fez com que se criassem as organizações ilegais para manter esse comércio. E elas se armaram para proteger o seu comércio. Além disso, a altíssima apreensão de pessoas para o sistema prisional tem alimentado essas facções. Muitas dessas pessoas, inclusive, entram no sistema prisional sem estar ligado a nenhum grupo organizado e saem de lá vinculados a alguma facção.

 


Foto: Amanda Tropicana / Iniciativa Negra

 

A Bahia desde 2019 tem a polícia mais letal do país. O discurso da violência policial muitas vezes seduz a opinião pública e parece difícil em épocas eleitorais algum político querer discutir isso a fundo. Como você observa isso?
É Importante observar que essa escalada da violência policial na Bahia coincide com a aprovação de uma resolução em 2019, assinada pela Secretaria de Segurança Pública e pelas polícias que mudou a forma de investigação de crimes letais cometidos por militares. Isso só foi derrubado em 2023 no Tribunal de Justiça da Bahia, que declarou essa medida inconstitucional. Na vigência dessa resolução, nós observamos a escalada da violência policial. Obviamente aumentou não apenas devido à resolução, como também por esse quadro de intensificação da guerra às drogas na Bahia, com tantas organizações disputando esse comércio.

 

Alguns analistas políticos afirmam que o estilo da polícia no estado não mudou, pelo contrário, piorou em letalidade. Porque é difícil mexer nisso?
Existe de fato uma dificuldade do poder civil de controlar o poder militar. Isso não é apenas um problema do governador Jerônimo. É de qualquer governador brasileiro. Isso é uma condição que a própria Constituição criou ao determinar o lugar da Polícia Militar e estabelecer dois controles. As Forças Armadas e o Poder Civil controlam a mesma polícia, mas deveriam na verdade compartilhar esse controle. Só que isso não acontece. Ainda assim, o governo poderia ter tomado medidas dentro desse quadro que pudesse de fato combater a escalada da violência.

 

Quais, no caso?
Por exemplo, um investimento real em solução dos crimes contra a vida, que ainda é abaixo de 20% na Bahia, e investigação e punição de agentes que tenham cometidos atos ilícitos graves. O que eu tenho dito bastante é que não é uma crise de gestão exclusivamente da Bahia. É uma crise do modelo. A Bahia talvez represente o que no Brasil inteiro a gente pode notar. Que é um modelo que é baseado no equipamento de guerra, que é a Polícia Militar, que não tem condições de promover vida. Um equipamento de guerra não se movimenta para proteger a vida. Ele se movimenta para eliminar o inimigo e proteger o território e a propriedade. Então, a gente precisa tirar esse modelo e construir de fato uma segurança pública baseada numa força com controle civil e delegar aos militares apenas as tarefas que lhe sejam pertinentes, que não é e nem nunca deveria ter sido a prestação de segurança pública cotidiana.

 

De imediato, o que o governo baiano poderia fazer para começar a melhorar essa situação da violência?
Primeiro, é necessário que o governo ita que o problema é grave e combata o discurso de vincular qualquer letalidade com eficácia e eficiência. Porque isso a, inclusive, uma mensagem ruim para a tropa. Não é possível que somente a Secretaria de Segurança Pública lide com o tema da segurança. É necessário entender que a segurança pública não é só coisa de polícia. A gente precisa saber qual o papel da Secretaria de Educação, qual o papel da Secretaria de Cultura. Nós divulgamos que 81% dos dias letivos nos últimos dois anos foram impactado por pelo menos um tiro nas escolas públicas de Salvador. É necessário chamar, de forma real, a participação da sociedade civil para a construção de soluções. Mas sem itir o problema e querer reverter o quadro do jeito que está, a gente tem pouquíssima condição de mudar.

 


Foto: Tony Silva - Nucom / Seap

 

O governador Jerônimo precisa do presidente Lula para enfrentar essa violência?
Nem Jerônimo e nenhum governador vão ter condições de resolver isso sozinho. Porque o mercado de drogas e de armas é transnacional. Então é fundamental uma perspectiva de colaboração. Na PEC da Segurança do governo Lula, uma das poucas novidades interessantes é a busca por padronização dos dados, que hoje é completamente autônoma nos estados. A gente sempre diz que produzir dados com qualidade nos ajuda a fazer boas políticas públicas. De resto, essa PEC fortalece todo o discurso de guerra, como usar a PRF e a PF em mais operações. Isso não vai reverter o quadro ativo. É você olhar para uma guerra e não pensar em desmontar ela. Você quer aumentar o aparato bélico que vai fazer com que as organizações ilegais também se reforcem, e ocorre aí um contínuo de violência. Não que não seja necessário o combate ao crime organizado, mas tem que ser com base na inteligência, na produção de dados e no diálogo com a sociedade civil.

 

O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, fez recentemente uma provocação ao governador Jerônimo Rodrigues, sugerindo que ele, Caiado, daria jeito na segurança da Bahia. Ele tem moral mesmo do que está falando ou apenas fez uma bravata?
É importante que a gente perceba os índices de segurança pública. Aqui na Bahia, de dois anos seguidos para cá percebemos uma redução dos números. Mas isso não necessariamente informa que tem uma política funcionando. Muitas vezes os dados são sensíveis a eventos extremos. Por exemplo, em relação aos dados do mês de setembro e agosto deste ano nós já sabíamos que iam ser menores do que o do ano ado em Salvador. Porque em agosto e setembro deste ano não teve a morte do policial federal em Valéria que desencadeou uma operação de vingança. Então aumentou o número de homicídios naquele período por conta de um evento. Se esse evento não acontece no ano seguinte, vai ter uma redução nos números, mas não quer dizer que a política de segurança pública funcionou. É fundamental que a gente consiga sempre avaliar a política de segurança pública a médio e longo prazo para saber se é uma conformação das organizações criminais e por isso reduziram-se os homicídios ou se é de fato um investimento na profissionalização das polícias e isso fez com que reduzisse momentaneamente os conflitos armados. Mas não dá para nenhum governador se gabar de ter resolvido o problema de segurança pública. Porque a gente continua fazendo com que a polícia atue no sentido de guerra e de controle, sobretudo de pessoas negras, periféricas.

 

Dos 417 municípios baianos, 60% deles têm até 20 mil habitantes. Nesses locais, o efetivo policial é pequeno e não há guarda municipal em muitos deles. No entanto, o tráfico e as facções já estão presentes promovendo crimes. Como as prefeituras, dentro das competências delas, podem ajudar na melhora da segurança?
Esse é um caminho importante. É preciso convocar as prefeituras a participarem do debate da segurança pública porque muitas vezes elas se abstêm de trabalhar sobre o tema de segurança pública. Mas na verdade as pessoas vivem e morrem nos municípios. Por isso é fundamental que os próprios municípios, caso queiram participar do Sistema Único de Segurança Pública, criem os seus conselhos municipais para discutir soluções. Isso aí vai dar sugestões ao executivo estadual, vai dar sugestões a atuação da polícia, mas de fato não tem uma fórmula mágica que seja aplicável a todos os municípios baianos.

 


Foto: Tony Silva - Nucom / Seap

 

Como quebrar a resistência de parte da população que não se importa com a truculência policial, desde, é claro, não seja contra ela?
Tem setores na sociedade que não só não se importam com essa violência contra a população preta, periférica, como se beneficiam disso. Elas estão muito confortáveis e não querem ser convertidas do contrário. Mas uma grande parte da população brasileira também tem uma dificuldade porque não lhes foi apresentada uma alternativa no campo da segurança pública, que talvez seja um dos nossos grandes problemas na redemocratização do Brasil.

 

Isso se deve a quê?
O campo progressista como um todo não conseguiu apresentar um projeto alternativo ao dos militares para a segurança pública. Nós fizemos contribuições robustas para a construção do SUS [Sistema Único de Saúde], do ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente], e de vários outros mecanismos, mas no campo da segurança pública, o campo progressista investe no discurso punitivista, que é baseado na lógica da guerra e da violência. E isso faz com que a população brasileira que se importa não consiga visualizar que há alternativa fora da lógica da guerra. E a guerra também se beneficia do pânico e do medo criado por essa sensação de insegurança, e as pessoas querem os seus problemas resolvidos. Assim, se há problema é porque está faltando polícia, arma e viatura.

 

No Brasil, há alguns exemplos em segurança pública que a gente possa se inspirar?
Tem experiências conhecidas em cidades menores, como Canoas, no Rio Grande do Sul, que é sempre referenciada como uma um local onde a inteligência ajudou a distribuir as forças policiais, evitar conflitos e criar uma nova relação com a comunidade. Ao redor do mundo tem experiências como a de Medelín, na Colômbia, que reduziu em 80% os crimes contra a vida na década de 1990. Ao invés de investir na guerra, se investiu na cidadania. Ao invés de mandar mais arma, mais viatura, mais colete, mais tiro, investiu em mais oportunidade, educação, transporte, cultura, criando um ciclo virtuoso na comunidade que não dispensa o trabalho da polícia.

 

Descriminalizar as drogas serviria para diminuir o poder das facções criminosas? Uma vez em entrevista ao Bahia Notícias, o então secretário de segurança pública, Maurício Barbosa, disse a descriminalização pelo menos da maconha poderia atingir em cheio essas facções. Como você avalia isso?
Liberar as drogas nunca foi pauta de ninguém. Quando se fala em regulamentar quer dizer controlar a partir do Estado e das suas instituições. Descriminalizar vai tirar o peso da atuação sobre o usuário e é fundamental que a gente comece a fazer esse trabalho para resolver o que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu. E o sistema prisional virou um ambiente de altíssima violência de estado, de depósitos e pessoas, e essa violência é sentida fora dos muros. Com a regulamentação, a gente pode também fazer as reparações necessárias. Reparar as comunidades, as famílias e as pessoas atingidas pela lógica da guerra e criar uma cultura de pacificação. Os números de violência letal no Brasil são de países que estão em guerra, 50 mil assassinatos por ano só é aceitável no Brasil porque nós estamos falando de uma maioria absoluta de homens negros. Se nós tivéssemos um quadro de 50 mil pessoas brancas assassinadas no Brasil, o país estaria parado, chocado, chorando e tentando resolver.